«O casamento de duas pessoas do mesmo sexo é uma das nossas
questões “fracturantes” (aliás, na televisão tudo é “fracturante”, desde um
comício em Alguidares de Baixo até ao Benfica – Porto). É normal que suscite os
mais contraditórios pontos de vista. Extraordinário é que haja políticos que
abordam a “família” como um dado inerte, congelado numa zona imaculada da
história do mundo. Será que não viram James Dean no filme Fúria
de Viver? Será que não sabem que a história da família é também a
história das suas permanentes transfigurações? O filme já tem mais de meio
século e, pelos vistos, ninguém comprou o DVD. Um dia destes, talvez surja em
vez da telenovela, essa grande escola familiar e sexual.» Este parágrafo do
João Lopes, na revista Notícias TV do JN, é demasiado fecundo para ser
despachado numa publicação sobre programação televisiva, entre grelhas e
entrevistas a famosos.
Neste Natal o James Dean vem-me parar à mesa por tudo; mas
na questão do casamento homossexual apresenta-se particularmente oportuno,
sobretudo pelo filme do Nicholas Ray, Rebel without a cause, em que
a invenção de um conceito próprio de “família” aparece como a única hipótese
dos protagonistas cohabitarem com uma realidade que lhes é hostil e estranha,
de sobreviverem num mundo “normalizado”. O que se tem debatido sobre a questão
anda precisamente à volta disto. Faço, por isso, minhas as palavras do João e
recomendo que vejam ou revejam o filme mesmo antes da petição que reclama um
referendo entrar no parlamento.
publicado em 26.12.2009